sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Officium Tenebrae

[com alteração de cores, pormenor da Crucifixão,
de Matthias Grunewald (1470-1528)]

Agora, só faltam as palavras.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Canção de Inverno

All alone, pintura de Iman Maleki

- Sim, disse o Génio, três desejos. Podes ser rico, posso levar-te a Tumbuctu ou a Samarcanda, podes ser califa ou vizir ou um homem sábio. Três desejos.

- Bem, disse o Aladino, não sei se quero ir a Samarcanda e de certeza não gostava de ser um homem sábio. Podes dar-me uma taça de morangos com natas?

E o Génio fez aparecer uma taça de morangos com natas.

- Que bom, disse o Aladino, com colher e tudo. De repente fiquei com medo de ter de gastar o segundo desejo a pedir uma colher. Não era preciso ser de prata, sabes?

- És um homem estranho, respondeu o Génio. Da última vez que me pediram morangos foi mais difícil, porque ainda não havia morangos no mundo. Tens mais dois desejos.

E o Génio fez uma vénia (uma génia, pensou o Aladino, que gostava de brincar com as palavras).

- Podes dar-me uma capa? Está um bocadinho fria a noite, e queria dar um passeio. Negra, sabes, com uma fivela prateada. Sempre quis ter uma assim.

O Génio fez aparecer uma capa mais negra que a própria noite, com uma fivela onde se podia ver um dragão que ao mesmo tempo era uma flor e ao mesmo tempo era uma canção de Inverno.

- Linda! Disse o Aladino, baixinho. Obrigado, Génio. Com isto não volto a ter frio.

- Dois desejos, respondeu o Génio, inclinando-se de novo. Muito fáceis até agora. Pensa bem no terceiro, que é o último que te posso conceder.

- Faz com que todos digam a verdade esta noite, disse o Aladino como se não tivesse a certeza. Todos e eu também, só esta noite. Mesmo que seja uma verdade terrível.

- Nunca me tinham pedido o fim do mundo, respondeu o Génio, e também falou como se hesitasse.

(escrito em Março de 2006)

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Hoje


Window, de Majid Arvari (Iran): pintura de 2006

Veio um e disse:

- Mundo visível, repousas na noite imprecisa como uma criança serena. Mas a noite - de que mundos além dos mundos vem a secreta luz, a inacessível luz que nos permite vê-la?

E outro:

- Pobre criança, tão pequena e já cercada pelos véus, já vencida pelas janelas fechadas. Ainda não sabes, e já te prenderam; ainda não falas, e já te calaram.

E um terceiro:

- A técnica de colocação dos vidros não é a mais moderna.